14 de novembro de 2006

Empatia

quem está sentado na frente das lojas desocupadas apropria-se das desesperanças de quem passa e sabe ler a apatia-no-olhar de cada um.
« . faz-me companhia para um café.»
provavelmente abandonou as causas para a progressão da sociedade, que consomem os dias e transformam um envolvimento romântico em sexo ocasional.
« . por favor...não me recebas com essa ternura que mimetiza o amor.»
ou então foi abandonado pela família, pais ou filhos ou netos, por estar gasto e já não servir, como um trapo-de-chão desbotado, roto e esfarrapado.
« . nunca hei-de constituir família.»
recorda os risos da juventude, aquele dia de que ficou a data, sem nada restar do que o tornou marcante. reconhece finalmente que o indivíduo é a unidade funcional da civilização, e que por isso também estar-só ou passear de mãos dadas é uma revolução, uma viragem no poder.
« . estou só exausta de não receber flores.»
o nevoeiro volta a descer. aquela menina já não traz rancor.
« . ninguém volta ao que já passou.»
tenho pressa.