2 de agosto de 2004

Riso

acordei. o barulho dos sapatos no chão. e a mão quente dela por debaixo da minha boca. a mão inesperada dela. o calor inesperado da mão. naquele (entre)son(h)o, lambi os nós dos dedos e mordi as costas da mão. e soube então que não era aquela a mão do sonho que eu sonhava antes do barulho dos sapatos no chão. aquela mão era pequena e quente. a mão que eu sonhava tinha dedos compridos e esguios e jamais voltaria a aquecer. e não foi o barulho dos sapatos que me acordou. aqui não se ouve o barulho dos sapatos. foram as ratazanas. e as ratazanas correm descalças. ela está descalça, debaixo do frio dos cobertores que não aquecem. agora ouvi nitidamente aquele riso. o riso de Sófocles. e adivinho, na penumbra do submundo, os olhos líquidos e o esgar do sátiro.

o romantismo infractor do crime passional. qual é o romantismo que na sua autenticidade não infringe? a libido era uma ferida aberta nas tuas costas.