21 de abril de 2006

Gaivota

A propósito da peça «A Gaivota», de Tchekov
em cena no Teatro do Bairro Alto pelo Teatro da Cornucópia
A despropósito de um pássaro-de-papel-sem-nome

nos bastidores

«Quer parecer-me que esta gaivota também é um símbolo, mas não o entendo, desculpe-me. Sou demasiado simples para poder entendê-lo

Nina
havia nessa peça uma mulher que trajava sempre de preto, por estar de luto com a vida. uma porta aberta deixa entrar a música que o édipo-escritor tacteia no piano. a mãe da pequena (enquanto afaga os lençóis do velho que, por leviandade, quer viver em vez de esperar morrer) diz-lhe que ele só toca quando está triste. mas é só o percurso destes dedos que a faz dançar.
uma gaivota à beira de um lago.
passa um homem que nada mais tem para fazer, e atira.
essa mãe era a mulherzinha roliça de casamento infeliz (esposa do feitor da quinta, cuja preocupação mor era zelar pela boa saúde dos seus cavalos) e o homem que, por ser médico, não pode fugir às mulheres. 'todos tão nervosos'.
um pássaro de papel à beira de um copo.
fica um rapaz que tem outras coisas em que pensar, e amachuca-o.
para dentro de uns olhos verdes. 'não, não era nada disto'. ela trouxe-o com ele? para dentro da mala de uns olhos verdes. era assim não era? esse pássaro não tem nome porque não durou mais do que alguns instantes, diz ele. dizem elas que, embora o pássaro per se possa não ter persistido, aquele da fotografia tem uma identidade. repetindo a linha de pensamento ainda não concluída, é como a diferença entre o objecto real e a representação mental. 'não, não era nada disto'.

2 Comments:

Blogger R. said...

às vezes era bom ter olhos verdes.

8:32 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

«já falei tantas vezes do verde dos seus olhos» - é assim que começa A FESTA da homónima, não é?

esqueci-me de uma coisa: a rapariga de luto pela vida, depois de alguns anos de casada com o mestre-escola, diz apenas: «estou tão farta dos teus modos!»

11:47 da tarde  

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