9 de abril de 2006

Balada de Moscovo

ou História de Adultos Contada a uma Criança
ou Esquizofrenia

lamento, não posso continuar a ser a tua amante russa. sou uma matriosca e as outras seis de mim, que são sucessivamente mais pequenas e parasitam o meu mundo interior, estão em total desacordo - comigo e umas com as outras. a mais pequena, que é também a mais irrequieta e reinvindicativa, tem ciúmes porque as tuas gentilezas e os teus mimos só contemplam as camadas mais externas. a outra a seguir, que é nervosa e caladinha, inveja a terceira por conseguir zangar-se contigo. a do meio é virtuosa e, por isso, desinteressante. a seguinte confunde o seu lugar na segunda tópica freudiana com a posição que realmente ocupa neste organismo de barro pintado. a penúltima chora. esta outra, a última, mostra-se, e mostra-se sempre o contrário das outras, que não pode ser porque tem que proteger. lamento, mas não posso continuar a ser a tua amante russa.

3 Comments:

Blogger R. said...

seis bonecas russas: seis bonecas loiras?, seis estados de alma distintos o suficiente para criarem fronteiras entre si como entes diferenciados?...comovi-me com a penúltima.

2:50 da manhã  
Blogger T. said...

«A menina tinha os cabelos louros. / A boneca também. / A menina tinha os olhos castanhos. / Os da boneca eram azuis. / A menina gostava loucamente da boneca. / A boneca ninguém sabe se gostava da menina. / Mas a menina morreu. / A boneca ficou. / Agora também já ninguém sabe se a menina gosta da boneca. (...) »
(Carlos Queiroz, Teatro da Boneca)

8:06 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Sabes que as bonecas russas podem ser desmontadas... com cuidadinho. E quem sabe, lá no fundo da sua solidez de madeira e pintura, não escondam um chazinho doce de violetas?

12:18 da tarde  

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