31 de dezembro de 2007

Caos Criativo

«Nos meses e anos após teres sido expulso de Berlim-Oeste, entrei num buraco total. De que serviam uns tantos carros incendiados e janelas partidas? A verdade é que o nosso movimento não era inspirado pela vontade das classes oprimidas, mas sim por um sentimento burguês de culpa por parte dos mais afortunados. Mergulhado naquela desorientação pessoal, pus-me a considerar as míseras alternativas que eu podia escolher. Segundo os nossos autores anarquistas, um conflito mundial deve conduzir a um caos criativo. Se esse caos fosse explorado com inteligência, deve dele emergir uma sociedade livre. Mas olhando à minha volta tive de reconhecer que as condições prévias para o caos criativo não existiam, nem existiam os seus exploradores inteligentes. O caos pressupõe um vazio do poder e o poder da burguesia ganhava terreno em toda a parte, tal como a força militar dos Estados Unidos, de quem a Alemanha Ocidental era actualmente o arsenal e o cobarde aliado numa guerra mundial que parecia inevitável. Quanto aos exploradores inteligentes, estavam demasiado entretidos a acumular lucros e a guiar Mercedes para se aproveitarem das oportunidades que nós lhe tínhamos criado.»

John Le Carré, in Amigos Até ao Fim

29 de dezembro de 2007

Geopolítica


«A resistência passiva transformou-se numa não-resistência, a desobediência civil passou à violência armada. Os grupos maoístas lutam entre si, para regozijo da CIA, os extremistas sobrepuseram-se aos radicais e os que não se conformam com os reaccionários de Bona são banidos daquilo a que se chama sociedade. Talvez não saibas que temos agora uma lei que afasta oficialmente da função públia quem se recuse a prestar obediência aos princípios básicos da democracia liberal! Um quinto dos empregados da Alemanha Ocidental, desde condutores de comboios a professores como eu, são considerados não-gente pelos fascistas! Imagina, Teddy! Eu não posso guiar um comboio se não quiser beber Coca-cola, bombardear a barragem do Rio Vermelho e napalmizar as crianças vietnamitas! Daqui a pouco vou ser obrigado a usar um S amarelo para toda a gente ficar a saber que sou socialista!»

(ainda) John Le Carré, in Amigos Até ao Fim