28 de abril de 2009

Vinil

tenho-me desleixado um pouco da política internacional. este mês é um mês que apela ao revivalismo narcisista das forças anti-regime e me deixa talvez com pouca margem de progressão intelectual. também não se pode andar sempre nessa azáfama, já se sabe que não estou talhada para a militância, é preciso reflectir sobre o passado, ficar sentimental às vezes, deixar a lagriminha brilhar ao canto do olho, não é vergonha nenhuma. e gosto tanto das coisas antigas, ainda mais se forem objectos esquisitos. como o sofá que encontrei ontem de manhã, no meio da rua, virado ao contrário, abandonado no seu padrão de flores. pensei:
" - um dia hei-de decorar uma casa só com coisas atiradas pela janela de alguém. "
é uma das muitas coisas sem finalidade nenhuma que hei-de fazer um dia. porque creio que não é preciso uma finalidade para todas as coisas que quero fazer. posso querer ouvir-te respirar sem uma finalidade.

27 de abril de 2009

Metal y Melancolia

na minha cidade perfeita, nos jardins há sofás e candeeiros de pé que de dia dão sombra e à noite dão luz e telas de água cadente em que passam filmes de amor quando me sinto sozinha. a minha cidade perfeita não é nenhuma das que visitei. (como o meu homem perfeito não é nenhum dos que me visitou. ou não o podiam ser ou não quiseram sê-lo. o que mudou a minha vida foi, obviamente, aquele que primeiro se ocupou de mim e só no fim me fez saber quanto me queria. quando penso nele lembro-me inevitavelmente da noite a acabar mesmo antes do dia a começar e de toda a perplexidade no caminho de carro até casa. acho que na altura nem conhecia os the smiths, que já lá vão alguns anos, mas agora a minha memória reconstruiu toda a sequência com a voz do morrissey em fade out, e na metáfora da noite a recuperar o fôlego para o dia.)

23 de abril de 2009

Propósito

ainda o mundo é uma criança. e o melhor do mundo são as crianças. às vezes dá vontade de ficar a olhar muito tempo a tentar perceber o comportamento aparentemente caótico e as psicoses ocupacionais. também já fui uma criança. e saint-exupéry sê-lo-á sempre. e as coisas que nos fazem felizes às vezes são como bolas de sabão, bonitas transparentes e das cores do arco-íris, e depois desaparecem em salpicos. a minha vida tem sido assim, e acho que já nem me importo que assim seja. tem sido assim com as pessoas, com os sítios, e uma vez por outra com as paixões. por enquanto, escolho a terra-do-nunca, este não-crescer num contínuo de transições. viajar, viajar, viajar. não descanso enquanto não conhecer o mundo todo. tenho vários propósitos e a inconstância é o mais constante.

21 de abril de 2009

Mojito

já ando nisto há alguns anos e ainda não aprendi as manhas do meu superego. ou desaprendi. o que me faz não dar ainda por finda a minha never ending story de desamores trágico-cómicos. não podia vir em melhor altura este encanto platónico, fazendo estremecer o meu rigor mortis emocional de tal forma que a princípio pensei tratar-se de uma perturbação de ansiedade. mas isto é outra coisa, faz assim um círculo à volta do umbigo e não dá falta de ar. tão-pouco cursa com sensação de morte eminente ou alterações do sono. (era o que me faltava, depois de todos estes anos de negação e literatura existencialista, uma paixão barroca dessas que tiram o sono e a fome.) não, na realidade apraz-me bastante este estado de alma. traz-me as coisas boas da infância, aquelas que me fazem chorar de paz (não sei bem explicar, mas é o sol a queimar as costas depois do mar, as gaivotas à minha volta numa tarde de inverno, a primeira história que escrevi). traz-me tanto de mim que já não sei se o que me encanta tanto não será só um reencontro com a mais bonita das bonecas russas que me habitam. e então deito-me e dou pontapés de entusiasmo no ar.

20 de abril de 2009

Tequila y Sexo

nestes dias a minha vida (que até me esforço por tornar o mais parecida possível com o marché aux puces ou um supermercado chinês) parece-me a coisa mais desinteressante. passar um dia que adivinho lá fora radiante de sol dentro de um gabinete de persianas fechadas, a ver crianças a berrar e adultos que têm a sorte de as ver crescer, faz-me pensar que esta ambição de ter uma carreira profissional satisfatória é quase perversa. primeiro, pela contingência social de que já não há carreiras médicas. depois, porque mesmo não havendo carreiras médicas, a minha não-carreira não me deixará provavelmente tempo disponível para ver uma criança crescer. é talvez uma visão pessimista, quem me lê bem sabe a tendência que tenho para exagerar nas desgraças (o que dá uma certa graça acrescida às pequenas coisas boas em que a maioria das pessoas não repara). desinquieta-me um pouco do desinteresse da minha vida (e desta inquietação de não estar a viajar pela índia ou pela américa do sul) pensar a medicina como humanismo.

19 de abril de 2009

Poema

nem a poesia se esgota quando os dentes se cravam no ombro nem o verso se torna no reverso de mim quando as costas se curvam. um poema pode ser triste, pode ser assim, pode não ser. este é o poema mais doce que li.

13 de abril de 2009

Abril

de volta para as festas e festivais de abril.